“Licurgo um legislador grego que acredita-se ter vivido no século quatro, antes de Cristo, foi convidado a proferir uma palestra a respeito de educação. Aceitou o convite mas pediu, no entanto, o prazo de seis meses para se preparar. O fato causou estranheza, pois todos sabiam que ele tinha capacidade e condições de falar a qualquer momento sobre o tema e, por isso mesmo, o haviam convidado.
Transcorridos os seis meses, compareceu ele perante a assembléia em expectativa. Postou-se à tribuna e logo em seguida, entraram dois criados, cada qual portando duas gaiolas. Em cada uma havia um animal, sendo duas lebres e dois cães. A um sinal previamente estabelecido, um dos criados abriu a porta de uma das gaiolas e a pequena lebre, branca, saiu a correr, espantada. Logo em seguida, o outro criado abriu a gaiola em que estava o cão e este saiu em desabalada carreira ao encalço da lebre. Alcançou-a com destreza trucidando-a rapidamente.
A cena foi dantesca e chocou a todos. Uma grande admiração tomou conta da assembléia e os corações pareciam saltar do peito. Ninguém conseguia entender o que Licurgo desejava com tal agressão. Mesmo assim, ele nada falou. Tornou a repetir o sinal convencionado e a outra lebre foi libertada. A seguir, o outro cão. O povo mal continha a respiração. Alguns mais sensíveis, levaram as mãos aos olhos para não ver a reprise da morte bárbara do indefeso animalzinho que corria e saltava pelo palco. No primeiro instante, o cão investiu contra a lebre. Contudo, em vez de abocanhá-la deu-lhe com a pata e ela caiu. Logo ergueu-se e se pôs a brincar. Para surpresa de todos, os dois ficaram a demonstrar tranqüila convivência, saltitando de um lado a outro do palco. Então, e somente então, Licurgo falou;
"Senhores, acabais de assistir a uma demonstração do que pode a educação. Ambas as lebres são filhas da mesma matriz, foram alimentadas igualmente e receberam os mesmos cuidados. Assim igualmente os cães.”
O autor do texto acima é desconhecido, mas não poderia ter texto melhor para ilustrar minhas considerações sobre Piaget e Vygostsky. Piaget privilegia os aspectos a maturação biológica, assim sendo, o desenvolvimento da criança segue uma seqüência fixa de estágios, onde os fatores internos preponderam sobre os externos. Vygotskyprivilegia o ambiente social reconhecendo que se esse ambiente variar, o desenvolvimento cognitivo da criança também sofrerá variações. Para Vygotsky não se pode aceitar uma visão única, universal, de desenvolvimento humano.
Piaget acredita que as crianças elaboram espontaneamente seus conhecimentos de acordo com o estágio de desenvolvimento em que se encontram. Ou seja, a socialização da criança parte do seu conhecimento particular de mundo e vai progredindo. Para Vygotsky a criança desde o nascimento, vai formando uma visão desse mundo através da interação com adultos ou crianças mais experientes.
Piaget acredita que a aprendizagem subordina-se ao desenvolvimento, minimizando assim o papel da interação social. Vygotsky, ao contrário, defende que quanto mais aprendizagem mais desenvolvimento, ressaltando assim, a interação social como fator determinante para este processo.
Utilizando conhecimentos da psicogenética para avaliar o desenvolvimento intelectual da criança, Piaget defendeu que a biologia associada a cultura, desenvolvia as habilidades do ser. Já para Vygotsky, que utilizou a psicologia social para suas conclusões, a sociedade associada a cultura é quem desenvolve essas habilidades.
Apesar das diferenças entre ambos não se pode negar que é enorme a contribuição destas teorias para que se possa entender a formação do sujeito e ajudá-lo na estruturação de seu conhecimento.
Voltando ao legislador grego Licurgo, lá do comecinho desta postagem, observamos que o ambiente em que o cachorrinho foi criado influenciou diretamente na sua aprendizagem e consequentemente no seu comportamento.
Eu também tive um cachorrinho criado com um coelhinho – daí o texto ter me chamado a atenção - que viviam brincando. Certa vez viajamos de férias e deixamos a empregada tomando conta da casa. Parece que a empregada aproveitou para tirar umas férias também, pois, segundo uma vizinha, o cachorrinho comeu o coelhinho. Ela assistiu ao massacre pela janela e nem seus gritos salvaram meu querido Rabicó. Claro que a empregada disse que apesar de ter se ausentado alguns dias, deixou ração suficiente para o Fred (meu assassino cruel). O conhecimento que minha digníssima empregada não tinha, era que cães são extremamente gulosos, e Fred deve ter comido toda a ração no mesmo dia, ficando sem nada para comer nos dias seguintes. Quer dizer, sem nada em termos, pois existia no mesmo ambiente um saltitante brejeiro e muito apetitoso coelhinho.
Moral da história: fatores sociais e culturais formam o ser, mas não podemos esquecer os fatores biológicos em hipótese alguma! Pelo menos não na educação de cachorrinhos!
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