sábado, 14 de maio de 2011

Professor refém x professor autônomo

Por muito tempo, os professores se sentiram reféns, e alguns ainda sofrem as conseqüências desse momento de aprisionamento da Educação brasileira. No entanto, com a proposta inclusiva, não há mais possibilidade de que o professor se mantenha nessa condição. É a hora do professor autônomo, livre, criativo.

O professor refém é aquele que espera o diagnóstico do aluno para iniciar qualquer forma de intervenção pedagógica e, muitas vezes, depois de conhecê-lo, chega facilmente à conclusão de que não tem onde nem como intervir, porque aquele aluno contém um parecer, uma súmula ou uma ficha com informações que podem ser traduzidas em incapacidades ou limitações. É o professor que espera que alguém diga quem é seu aluno e o que ele pode fazer.

Não faz tanto tempo que os alunos só poderiam chegar às escolas carregando consigo esses famosos diagnósticos psicopedagógicos. Esses instrumentos eram e ainda podem ser, se não compreendermos a inclusão como o certificado de garantia de que o professor precisa para ensinar (ou não ensinar) aquele aluno em particular, um atestado de incompetência do aluno e de competência do professor, ou seja, ele (o aluno) não aprendeu porque tem um “quadro clínico” exposto num diagnóstico que inviabiliza qualquer intervenção que o professor possa fazer.

Com a prática inclusiva, o professor não se torna refém de nenhum tipo de instrumento que rotula e marginaliza os alunos. Ele é livre para descobrir seus alunos no cotidiano da escola.

Os profes-sores sabem que, para ensinar, faz-se neces-sário conhecer cada aluno, aproximar-se dele, descobrir com ele os melhores cami-nhos, seu estilo de aprendizagem, seu ritmo, suas neces-sidades, suas pos-sibilidades. Sabem, ainda, que nenhum atendimento clínico, diagnóstico ou exame, realizado num ambiente estranho e impessoal, será capaz de fornecer infor-mações reais, significativas e permanentes sobre uma criança ou um jovem.

Por melhores que sejam as intenções de um diagnóstico, estão longe de ajudar no dia-a-dia da sala de aula, principalmente porque o ser humano é dinâmico, criativo, inteligente e, à medida que interage e modifica o meio, é modificado por ele. Portanto, o que determinado aluno expressou ontem, numa situação de avaliação, pode perfeitamente já ter sido reconstruído no dia seguinte.

Com a intenção de informar o professor, o diagnóstico tem servido muito mais para criar estigmas na sala de aula e na escola, para legitimar a discriminação e o preconceito. O aluno diagnosticado como possuidor de retardo mental perde imediatamente sua identidade e é reconhecido somente pelo rótulo que lhe colocam. O mesmo acontece com o cego, com o surdo, com o paralisado cerebral, com o autista, com o psicótico, etc. Ao longo de nossa experiência docente, descobrimos que os alunos que mais são ajudados são exatamente os que chegam sem rótulos e etiquetas; aqueles de quem o professor precisa aproximar-se, envolvendo-os, conhecendo-os e conquistando-os.

No modelo inclusivo, os rótulos são mandados embora, e o professor tem a oportunidade de conhecer cada aluno a partir dele próprio e de sua família. Tem-se, portanto, uma excelente oportunidade de aproximar as famílias das escolas e os professores dos alunos. Antes, os professores tinham, através dos diagnósticos, todas as informações, inclusive familiares, das crianças, isentando os pais do compromisso de ajudar os professores no processo de conhecimento dos seus filhos. Além disso, já não precisavam dialogar com os alunos, pois tinham todas as informações numa “ficha”, como se isso fosse possível. No modelo inclusivo, a parceria entre pais, professores e alunos é imprescindível, sem ela não haverá condição de sucesso, e os professores sabem disso e já o dizem há bastante tempo: eles precisam do envolvimento dos pais e precisam de tempo para isso.

Com a inclusão, todos têm um compromisso com o processo educacional. É falsa a idéia de que, no modelo inclusivo, tudo é delegado ao professor. Pelo contrário, em nenhuma outra proposta, a responsabilidade foi tão compartilhada como agora. Se o professor muda sua atuação em sala de aula, a escola precisa oferecer as condições para isso, e as instituições e redes de ensino são compelidas a repensar sua organização, de modo que o professor desfrute das condições mínimas para a efetivação de uma proposta grandiosa e envolvente. Saia da condição de refém e passe a assumir uma atitude autônoma.

Inclusão é um instrumento importante para assegurar a construção de um modelo educacional que venha a atender todos, e não somente os alunos com deficiência

Sandra Alves da Silva Santiago é mestra em Educação pela Universidade Federal de Pernambuco, com formação em Pedagogia e especialização em Educação Especial e Psicopedagogia. Desenvolve suas atividades docentes em turma de Alfabetização (Secretaria de Educação de Pernambuco) e de Ensino Médio como professora itinerante (Secretaria de Educação do Recife). Leciona ainda na Faculdade de Ciências Humanas de Olinda (Facho) no curso de Pedagogia e atua em diversos cursos de especialização em faculdades do Estado como professora e como orientadora de pesquisas sobre temáticas afins.



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